
Dia Internacional de Combate à LGBTfobia é comemorado neste sábado (17) (Foto: Conflgbtqia.org/Divulgação)
No dia 16 de maio de 1990, quem consultasse o Código
Internacional de Doenças (CID) encontraria a homossexualidade listada sob o
número 302.0, como se fosse uma patologia. A realidade começaria a mudar
no dia seguinte, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS), durante
sua 43ª Assembleia Mundial, decidiu retirar oficialmente a
homossexualidade da lista de doenças mentais, reconhecendo que ser LGBT
não é desvio, nem distúrbio.
Desde 2004, o 17 de maio passou a ser
reconhecido internacionalmente como o Dia Internacional de Combate à
LGBTfobia, em referência direta a essa vitória simbólica e concreta dos
direitos humanos. Em 2025, a data completa 35 anos da decisão
histórica da OMS.
Uma luta contra a patologização iniciada no século 19
Segundo o professor de Direito da Unifesp e coordenador
do Núcleo TransUnifesp, Renan Quinalha, o processo de patologização da
homossexualidade tem raízes no século 19.
“A primeira vez que o termo aparece, em 1869, como homossexualismo,
é num tratado de psicopatologia sexual”, explica Quinalha.
Com o avanço do século, o discurso da homossexualidade como
doença se intensificou. Hospitais psiquiátricos e manicômios judiciais
recebiam pessoas homossexuais, muitas vezes internadas à força. Dentro
desses espaços, praticavam-se "terapias" de reorientação sexual
brutais, como eletrochoque, convulsoterapia e até lobotomias.
Manual de doenças consolidava preconceitos
A patologização foi oficializada na medicina com a sexta
edição do CID, publicada em 1948, que classificava a
homossexualidade como transtorno de personalidade. Já em 1952, a Associação
Americana de Psiquiatria (APA) lançaria o DSM-I (Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais), incluindo a homossexualidade como “desvio
sexual”.
Movimento LGBT ganha força nos anos 1970
As primeiras vitórias contra essa classificação vieram na década
de 1970. Em 1973, a APA retirou oficialmente a
homossexualidade do DSM. O impacto dessa decisão reverberou em diversos países.
No Brasil, o processo seguiu em 1985, graças à
mobilização do Grupo Gay da Bahia, que organizou um abaixo-assinado
com milhares de assinaturas, incluindo figuras políticas como Fernando
Henrique Cardoso e Mário Covas. O documento levou o Conselho
Federal de Psicologia a desconsiderar a homossexualidade como doença,
um marco no país.
OMS retira homossexualidade do CID em 1990
A retirada definitiva do CID, pela OMS, foi o
grande ponto de virada no plano global. Em 17 de maio de 1990, a
homossexualidade deixava de ser considerada um transtorno, em um gesto com forte
impacto político, social e simbólico.
“Essa decisão reforça o processo de despatologização que já
vinha se intensificando. Foi um marco de validação da luta e da existência das
pessoas LGBT+”, aponta Quinalha.
35 anos depois, a luta continua
Apesar dos avanços, práticas discriminatórias ainda
persistem, inclusive com “terapias de cura gay” sendo ofertadas por comunidades
religiosas e clínicas clandestinas, contrariando resoluções do Conselho
Federal de Psicologia e do Conselho Federal de Medicina.
“Infelizmente, a patologização ainda existe, especialmente
em espaços ligados a denominações evangélicas conservadoras”, denuncia o
pesquisador.
Governo reconhece importância da data e reforça combate à
LGBTfobia
Nas redes sociais, a ministra dos Direitos Humanos e da
Cidadania, Macaé Evaristo, destacou que o Dia Internacional de Combate à
LGBTfobia foi oficializado no Brasil em 2010, pelo Ministério da
Saúde.
“A data é um momento de reflexão e resistência, mas também
de celebração das conquistas obtidas por meio da luta dos movimentos sociais e
ativistas”, escreveu a ministra.
Apesar dos progressos, Evaristo alertou que a população
LGBT ainda enfrenta violações de direitos, discriminação e violência
motivadas por orientação sexual ou identidade de gênero.
Um Brasil mais justo e plural: o papel da sociedade
Especialistas, ativistas e autoridades são unânimes: o
combate à LGBTfobia passa por educação, políticas públicas e respeito à
diversidade. O reconhecimento da homossexualidade como expressão natural da
sexualidade humana foi um passo fundamental, mas o combate à violência, ao
preconceito e à marginalização ainda é urgente e necessário.
O 17 de maio é, portanto, um símbolo de luta e
conquista, mas também um chamado à ação contínua, para garantir que nenhuma
pessoa seja discriminada ou ferida por ser quem é.